sábado, maio 16, 2009

A briga de galos balineses. de Gueertz , uma resenha...


Gueertz me ensinou que vergonha é algo externo, que está baseada nos valores alheios , sendo um dos maiores contribuintes da minha sem-vergonhice.





Briga de Galos
No capítulo “Um jogo absorvente: Notas sobre a Briga de Galos Balinesa” do livro A interpretação das culturas
pudemos observar como uma aldeia balinesa tem sua cultura vinculada à briga de galos e como esse elemento é significativo na constituição dos indivíduos e na relação social que transparece e permeia os ritos locais.Colocando uma lente de aumento nas fissuras, no ocasional, no instável podemos observar como a estrutura dá espaço para esses acontecimentos e como que esses acontecimentos refletem a estrutura. Tentando pensar nas estruturas de sociedade ocidental capitalista de hoje realizamos uma cena com elementos significativos de possíveis paradigmas que estão aqui presentes.A cena se passava num lugar urbano fechado onde jovens de classe média alta se desafiavam num jogo de roleta russa, a arma era passada de mão e mão até que num determinado momento um participante desiste. Logo em seguida, um outro participante gira o gatilho e morre. Como troféu, os que tentaram e continuaram vivos comemoram tirando uma foto junto com o morto.Antes de falarmos em especial da cena vamos descrever um pouco mais sobre o que representava a briga de galo para a cultura balinesa, para que assim aprofundemos nossa análise na cena proposta.Um aspecto que chamou atenção na briga de galos foi o paradoxo de ocorrer justamente numa aldeia calma e afastada uma manifestação tão festiva de incentivo à violência dos animais. De certo modo, os animais representavam os próprios habitantes e simbolizavam o poder centrado no status e a briga de galo era uma maneira de se adquirir prestígio entre a população local. Sobre isso, o autor nos atentou ao fato de que essa subida de status ocorre de forma fictícia através das brigas de galo e que a realidade em si não é modificada com desnivelamentos de camadas sociais, mas que ocorre uma espécie de “salto através do espelho”.“Os homens prosseguem humilhando alegoricamente a um e outro e sendo humilhados alegoricamente por um ou outro, dia após dia (...). Mas não se modifica realmente o status de ninguém. Não se pode ascender na escala de status pelo fato de vencer brigas de galos; como indivíduo, você não pode ascender nessa escala de maneira alguma. E também não pode descer por esse meio. Tudo que você pode fazer é aproveitar e saborear, ou sofre e agüentar, a sensação engendrada de movimentação drástica e momentânea ao longo de uma semelhança estética dessa escala, uma espécie de salto de status por trás do espelho, que tem a aparência de mobilidade, mas não é real.” (GEERTZ, 1978: 310).As apostas eram feitas, mas o que estava em jogo mesmo era a reputação de quem perdia e de quem ganhava. Para isso o galo era preparado como um legítimo atleta. Muito dinheiro era gasto em sua preparação e muitas técnicas eram aprimoradas para que o galo conseguisse se defender e acabar com o outro. A briga de galo geralmente não durava muito. Quase sempre havia morte de um galo e o outro se saia ferido. O juiz era digno de muito prestígio, pois se tinha na briga de galos um evento único.Diante disso, e recapitulando nossa cena, é possível notar que a reputação também contou muito para o desfecho e realização da suposta roleta russa. Embora não seja corriqueira, essa situação também acontece na nossa sociedade e com diversas variantes. Tentamos traduzir para uma linguagem cotidiana a vontade das pessoas em se agredirem até beirarem o limite que é a própria morte física. A coragem demonstrada pelos actores faz com que a vida adquira uma nova significação em contraposição com o desafio da morte. A foto simboliza os valores baseados na imagem que se espera das pessoas dentro de um grupo numa determinada camada social e cultural. A representatividade do rito, assim como na briga de galos, adquire uma quebra no tempo/espaço atribuindo aos “ganhadores” uma efêmera posição de prestígio e status “eles sobreviverem” e talvez seja isso, diante de tudo o que passamos, até considerando nossa morte em vida, que seja o troféu para essa pessoas: elas não tem nada a perder, elas precisam resignificar o sentido de suas próprias vidas, elas precisam registrar uma identidade coletiva e provar a si mesmo que são alguma coisa e que fizeram algo de corajoso e desafiador e para isso é preciso que alguém morra, que alguém perca para que se tenha o vencedor. Essa é uma analogia bem nítida do estado de competitividade em que chegamos e ainda muitas vezes reafirmamos com nossas frases, nossos discursos darwinianos e ainda com as nossas atitudes. A figura da pessoa que desiste é sem dúvida elementar para a compreensão do todo. Ela é uma figura sem lugar, ela não venceu e nem perdeu, é o deprimido, aquele que as pessoas acreditam que inventa seus próprios problemas é o não inserido. Pensar nessa figura, assim como nessa feroz batalha pelo capital e pela significação do ser é pensar quais os caminhos que estamos traçando e inúmeras vezes nos confundindo com os próprios galos da briga de galos balinesa.[1] GEERTZ, Clifford. Um jogo absorvente: notas sobre a briga de galos balinesa. In: GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

2 comentários:

Anônimo disse...

Gostei muito ! obrigada !

Unknown disse...

Valeu mesmo, incrível